sábado, outubro 21, 2006

DEPAUPERADO

Afronto ao sono que me resta
e que cobiçara esticar o esgotamento.
A alcova já me preparara a cova.
Numa cabriola vivida
lancei-me da cama
e da sedução da morte
e, nu, fui aos afazeres
de um dia sem projetos.
Quem sabe, apreender
o Fox-Trote?
Este dia tributário e sem lamurias,
rende-me em suas teias de seda
e sigo pela casa recolhendo os objetos
que cairam de meu sonho
velando a minha letargia noturna.

Segui vestindo meias
mapeando pela casa
o micro-terreno
das sensações irracionais.
O tempo pacifica
este espírito que fenece
e que, as vezes, me habita
quase sempre me enlouquece.

Leio Drummond.
Participo do duelo flaco
entre o trompete de Chet Baker
e o piano de Harold Danko.

Os partidos políticos nacionais
disputam o poder pelo radio.
Marconi e a luta de classes
derrotam o meu jaz.

Volto ao aprendizado
do morrer condigno.
- Em Farewell me ensina
o mestre, um roteiro
para tal advento.

Fotos e guardados
para o lembrar esmaecido.
Livros, filhos e promessas
esquecendo/esquecido.

Amores anotados
com espátulas finas e frias
no cardo bulinoso e sangrento.
Será a vontade
de tentar o suicídio?
Os objetos, agora cênicos
pululam pelo quarto
feito em palco ardente
para o meu corpo heroico
encanecido (e abjeto)
sair voando pela janela
e se dissolver no vento
como tantos desejos perdidos
que amarelecem o rubro céu.

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