CARTA MARITIMA
Em matéria de amar, querida minha,
tenho, como o Pessoa, o anseio de lançar-me
do porto ao mar tenebroso e iracundo.
Na noite infinita, exilo-me do continente
e lá se vão pedaços partidos de mim,
como cartas em garrafas, aos quatro cantos do mundo.
Viverei por ai, espalhado: O tronco na Ilha de Elba,
as viceras em Maracaibo, a cabeça se estabelecendo
em África, num protetorado. Cambiantes, meus pés
tropicam entre os imbecis da beira-mar.
Hei de viver destino ingente, seguindo alhures a derrota
descrita num livro de bordo, disposta em carta náutica,
medida pelo sextante de um capitão vacilante,
perdida nau, vão quadrante.
Em matéria de amar, querida, sou levado,
pelas vagas que na praia vem quebrar.
Um seixo, concha oca, sem vida,
entre a vazante e a preamar.
Os meus horrores vem sucumbir
em um catre de asceta.
Vez por uma, uma por vez, me projeto no intolerável caos,
em derradeiro anseio de viuvez, frente às mulheres interiores.
Navego, porque é preciso, no dizer naval da precisão,
a resgatar-me das quase tormentas, e no Ártico, da fria monção.
Distingo as entonações do passado, e mais ainda, os ecos-senhores
deste futuro inexeqüível. Como um poeta penitente, esquadrinho
o destinar da viagem para a rota do perder-se.
Busco, celerado, o meu trunfo em ouro e prata,
singrando o espelho esparramado que vai refletir o céu argênteo,
desde acá, de la madre tierra, mas que, então, não nos revela
quantos são os caminhos que haveriam no mar.
quarta-feira, novembro 29, 2006
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