quarta-feira, novembro 22, 2006

A (RE) UNIÃO DO CEU COM O MAR

Andava, eu, solitário, um poeta sem vantagem,
pelo calçadão do Recreio, no domingo, um passeio,
deambulando o pensamento, respirando a paisagem.

O sol intenso desta primavera, que, após dias, voltava d’outras plagas frias,
à canícula já formava, fazendo empacar meu não-ofensivo passatempo,
para olhar e pensar no mar.Não, o pensar como um onírico território,
para qualquer poético devaneio, mas, num prosaico mergulho, com o poder de abrandar.

Fui levando o corpo, sem alívio, lá para a beira da praia.
- Que é isto, seu louco? (me repreende a razão bifronte,
quando me atiro de pronto, na água infinitamente fria).
- Queres, no choque, romper um vaso ?
- Queres ter um AVC?
Mergulhei, pensando no que eu podia querer?
Talvez, quebrar o acaso, este que une o mar verde ao céu azul,
pois as cores (sempre imaginei) são inevitáveis irmãs.
E de novo afundei a cabeça, ainda quente do sol.

Súbito, quando emergi, um susto: É como se visse um vulto,
no longe, caindo, caindo, em vôo e vertical-mergulho.

Penso que podia ter tido uma visão de atavismo,
tanto que, míope, duvido desta vista que inda apuro,
e reage ao tonteio do mar.

Se o sol, que lá ia no alto, tinha seu jeito próprio de ofuscar a visão,
havia também o frescor, que fácil, poderia, no delírio do prazer e da fé,
iludir e comover, para que a mente humana, pudesse ver mais do que é.

Mas, eis que meu olhar parado, n’algum ponto de alem-mar,
fez-se infesto ao ceticismo cartesiano de minha mente, descrente,
e no mistério, neófito, pude ver a gaivota, artesã laboriosa,
mergulhar seguidas vezes para desfazer o meu mal-feito,
chuleando o céu rasgado, reatando-o com o mar,
e tendo para o pesponteio, toda a linha do horizonte.

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