sábado, dezembro 01, 2007

Amor sem rumo

No céu da boca, o meu desejo.

Em Mar Del Plata, da-me um beijo.

Verso & prosa. Dance um tango.
Num mar de rosas, eu quero te-la.

Seja assim, seja como for
mas seja somente tu
o meu amor.

Céu aberto em chão de estrelas.
Siderada, perdida e de todo incerta...
a corveta esbelta trafega o pélago
luar azul na noite, vagas infensas
tenaz como o holandês voador
rumando à estrela do pólo sul.

terça-feira, março 27, 2007

POEMA TÉDIO


A minha poesia não tem cor, branca como eu
que é, exangue. Melhor mata-la com um tiro
de misericórdia, que vê-la perder-se num
poço sem fundo, procurando o senso médio.
A poesia que farei, daqui por diante,
não revelará, profundo, como o Chico Buarque,
o ente lírico de todas as mulheres do mundo.
Também não buscará rimar amor e dor.
Que asco! Deixará em paz a flor e o vernáculo.
Fartas doses de um tédio,
viscoso e inebriante,
não mais servirá à leitores condescendentes.
Anseio pela noite negra, sem cor.
Ao blackisbeautifful do mangue beat,
quero a cor inexistente da tarde,
o lapso da memnesis ardente.
Drummondianamente, as pedras no caminho
quero ver, para na retina, às reter e evitar o tropeço.
Quero a paz dos cemitérios e a dos sobreviventes.
Um poema roto, para o fim do planeta.
Nenhum para o seu recomeço.
Ai! Já me cansei de mistérios. Não quero mais
o cardo tema, senão o coração rubro pulsante,
traspassado por medieval lança,
ficando expostas as coronárias azuis.
Sem cateterismos literários,
não quero submergir na lambança
das emoções comuns, e emergir
ao soro de veias abertas na ácida madrugada.
O meu poema, que siga-me, à revolver
o solo com as mãos, a sentir o cheiro
úmido da terra, tendo a morte por espectro amigo.
Siga-me à perseguir, como poeta, a calma,
pois, já não consigo coisas,
alem da petulância de um oceano irredento,
e nem surpresas, alem do meu preciso plano,
de plantar Caju e Lima da Pérsia,
ou belas arvores florais num terreno
da Região dos Lagos, para que me ajudem
a colorir o cenário, enquanto os astronautas
dominam as estrelas do céu.

domingo, março 18, 2007

CANTORIA


Cantai. Nada me apressa mais.
Não me inquieta não ter para onde ir.
As frases não ditas,
Caíram-se como almas feitas una,
Sementes ao solo, novel verdejar,
Ecoando anosos desejos,
Como jardins à florir.

Cantai os delírios, poeta.
Cantai numa opera de gestos,
Os hinos célticos, cantai,
Tecei loas à deusa fortuna.

Os pássaros,
Que sobre os pomares, dançam
Ao vento elisio,
Que estirpem do teu peito,
O desatino.

O presente momento,
Dedica-o aos deuses, à Dionísio,
Que ainda haverá de vir, pois o amor
É como o vinho, sempre prevalece
E faz-nos espelhos da eternidade,
Nunca te abandona, nunca te esquece,
Num constante fluido a renascer.

E renasces no ruído da água,
Na alegria de um menino,
Nas épicas lembranças lusíadas,
Da batalha de Alcacer-kibir.

Cada homem, no mundo,
Como Dom Sebastião, o infante,
É mó solitaria, rodando alhures,
Em roda do proprio pino.
E, mesmo sem se dar conta,
Faz mover os moinhos de sonhos,
Nos monjolos, a agua à correr constante,
Faz no tear da vida, urdiduras
Do seu proprio destino.

segunda-feira, março 12, 2007

O BARQUEIRO DO AQUERONTE


Prisioneiro sou de um prisma celeste
qual folha forra desprezada e inservível
a planar alçando a boreste.
Se de antanho me haviam por belo e galante
com a Estrela da Manhã encimando o meu norte
e quando voava então
asas triunfantes
vejo-me agora precipitado direto ao Hades.
Vou sem freio que me conteste.
Sou palha e mais que palha esquecimento
sigo etéreo ao sabor de toda sorte.
Para o cruzar do rio
cabal espero o barqueiro
à findar-se a travessia
alcançando momento derradeiro.
E só não seguirei tão sózinho
porquanto ainda como alento
me acompanhe a poesia

quarta-feira, março 07, 2007

A ULTIMA VEZ EM QUE FALO SOBRE A LUA


“Do luar, acho que já não
há mais nada a dizer”.

Gilberto Gil




Porque pode tanto, a lua, medievo satélite
Do eterno espanto, todo engano ainda,
Se já lhes sabemos os segredos,
Debelamos nossas ilusões, palmilhamos o vazião
De seu corpo celeste e cinza, medindo-lhe o tamanho
E o tamanho de nossos medos, que nas sombras
De tua luz, aprendemos a dominar.
O que mais nos ensina a lua, que as áridas
E entranhadas pedras do João Cabral,
Não nos puderam ensinar?
Se o homem, profanador por princípio, já conspurcou
O teu chão arenoso, Oh, lua, explorou precipícios,
Recolheu teus rochedos, fincou-lhe a bandeira imperialista,
Imitou teus cenários na desolação dos desertos
Geopolíticos e interiores, porque ainda fascinas?
Porque há, ainda, os que sob luz vermelha
Do teu luar eclipsado, poluído, teimam em se apaixonar?
Ou será que mentimos, os corações amantes,
Que Já para mais nada, acendem-se (tudo se esquece),
Nestes tempos de simulacro existencial.
O que dirá, se atinar para que se faça lua, ou reine
O profundo breu. O negrume intenso do nada,
De nada que oriente o eu-poético, quando o amor
De agora, só vale, prosaico, pelo que se
Recompense em sonida espécie.
A lua, já não nos ensina nada.
Mas, de lá, da solidão de seu limbo,
Nua e crua lua, um dia, o cosmonauta russo
Iuri Gagarin, estancou a Guerra fria, e falou:
“A terra, quando vista de cima, azula-se,
E, como anil, ela fica”. E era poesia, não era chiste.
Sobre a tal lua, planetóide passivo, o qual não se sabe ver,
São desde os primórdios, os mesmos sentires.
Hoje, por difícil o signo dos humanos momentos,
O amor-sentimento (como a pedra, como o sertão,
Como a verdade) não se explica, não serve mais
Para nada, vivendo na contramão. Apenas sei que ele
(como a lua) existe, e ainda alumia o viver.

domingo, março 04, 2007

POEMA PROSA DA FLOR FORMOSA



Quando a rosa amena,
se encontra com a azálea,
chora em seu ombro, à soluçar,
a flor poema.

Com intensidade, chora sentida,
e desencantada. Inveja a vida,
que se espraia livre,
da margarida, às margens de estradas infindas.

Inveja todas as flores, as mirradas e as feias,
as pluriformes, inominadas, marias sem-vergonha,
ou, mesmo, as francas orquídeas, tão lindas.

Que benção, então, seria (pensa a rosa),
não ter o peso de tal beleza.
E, que não existissem amantes ou os poetas,
que lhe quisessem atribuir alguma precisa serventia,
para as inefáveis artes da humana sedução:

"De que vale ser, assim, tão bela, como sou,
se permaneço escrava desta inata condição".

MITOLOGIAS PATRIAS



Libertas, quae sera dia
O teu desejo
Inda que obscuro.

As quimeras
De teu quarto escuro
Vão devorar-te

Na Nova Acrópole
Da devassidão.
Nas tórridas terras brasilis

Do caju e da floresta sem fim
Imersas na bruma malsã
Iara e Janaína te convidam

Para um trotoir.
Vai junto o Caipora, tocando a flauta de Pã.

O lobo Guará e o tamanduá
De desfraldadas bandeiras.

O jacarandá e o pé de feijão.
Mitos, tesão e letargia, os bens do Brasil são.

CINZA INTERIOR

A Ferreira Gullar

A casa é presença
chão com falhas que esconde
o cisco de ovo não varrido.
A casa recende à café da manhã
e a outros cheiros de um dia
começando, misturado
aos ficados da noite.
A casa é o trabalho dos anos
a oclusão de cantos
a ruminação dos insetos.
A casa é o vento da tarde.
É a espera pela chuva, para o viver do telhado.
A casa é a saudade. É o beiral de abrigar ninhos
algaravia das andorinhas. Amor de pai/prontidão
de filho, promessas da eternidade.
A casa é vinho do porto, acalentando a noite fria.
É noite de amor lúbrico. A casa é choro de criança.
Lugar de morte e vigília.
A casa é a casa da fazenda, avistando da varanda
os pastos no vale umbrífero, lá no longe da memória.
A casa é útero ubérrimo à parir aconchegos
e a preguiça doce de ser.

quinta-feira, março 01, 2007

BRINCANTE


mal terminada aquela chuva
que à semanas castigava
andou em cabriolas pela calçada da rua
e a cada mocinha que encontrava
dizia que esta era a sua
namorada tão ladino em constante gargalhada
que a cidade veio ver quem fazia a palhaçada
chapinhado poças d´agua
nas esquinas e dizendo tais gracejos as meninas
veio de lá o prefeito veio o padre e o cachorro
do delegado ao notário os imortais da academia
que trouxeram o abecedário
veio gente de todo lado
e todos num amontoado sem nexo
com cara de espanto em vetusta multidão
boquiabertos perplexos ali ali
adiante o astro sol brincando brilhando
pulando as pocinhas do chão.

quarta-feira, fevereiro 28, 2007

ANJO ERRANTE

Dirte-ei: Sou o anjo errante
Que nos vales da vida vagueia
Arrastando sua mesma sombra
Ao sabor das sombras alheias.
Com as mesmas asas dobradas
Em cruz sobre o peito arfante
Sigo pela noite anjo insone
Incapaz de prover um milagre
Ido de pouso em pouso
Algo delirante e exposto
À luz de uma lua sombria.
Vago tonto condenado eternamente
Nas hordas celestiais o meu nome
Não se fala este já defenestrado.
O Deus que me sentencia
A estar assim exilado
Estando por certo ocupado
Quem sabe eu não te convido
A desfrutares comigo
Deste encontro inusitado?
Imposto me foi não ter um amor
Que seja vitimado a viver sozinho
E nem sequer me permitem
Encontrar para o corpo o repouso.
Mas se quiserdes cear amiga
Sentemo-nos no prado verde.
Ainda tenho um naco de pão
Duas maçãs tão cheirosas
Uma botija de vinho
E de ancestral esta sede.

IMERSÃO NO LUSCO-FUSCO


Alguns signos que se erguem,
Como emblemas de anunciação
Aos elementos me levam,
Gotas de chuva, torrentes,
Sementes, ventos furtivos,
Segredos de aluvião.

Quando o sol se faz presente,
No estio, carrega o vento,
E ofusca o fugaz momento.
À tona, o lusco das pedras raras,
Mistura-se ao brilho da paixão.

Se radicam os sentimentos,
Outrora, tão compassivos.
O corpo toma-se,
De cobiças dormentes.
A volição de um mormaço,
Que é prana, vital energia.
Basta o aroma ávido da terra,
E um beijo roubado a ninfa,
Que a esta lírica elegia,
Tão doce, vem alumbrar.

Oh, tais tontearias que me fazem
Em êxtase, caminhar sobre águas.
Pelo o rastro da maresia, ir-me,
Seguindo, e, no intimo, repetindo,
O heróico ânimo de uma grácil bateira,
Rompendo as tormentas no mar.

sábado, fevereiro 24, 2007

RODAR CATIVO














Os minutos se passam
quase audíveis
em refrão recorrente.

As horas se somam
plausíveis
cheias de promessa e sem nada deixar.

Os dias escorrem
entre os dedos
ceifados do calendário
e cerzidos na pele dos homens.

Os anos morrem
Amiúde
a cada manhã
retirados das pretensões gregorianas.

Como um filete no engenho d’água
os minutos, as horas, os dias e os anos
num rodar cativo, errático desperdício
incontrolável, surda repetição.

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

A MULHER DO QUARTO BRANCO



Recordo quando mirava
em abandono e transe místico
teu corpo nu, puro e branco
como a beleza simples de um vôo
definitivo como a evidência da partida.

Por alguns segundos, eras a aparição
da virgem, com os pêlos à mostra
de tez tão clara, com tão intensa fugacidade
que num sopro explodias, divinal melancolia
teu orgasmo sobre a noite
reacendendo o fulgor de um pleno dia.

Como rememorar este teu corpo
lânguido e pecaminoso?
Como olvidar o teu pranto
que nos devolvia a brisa
pelas artes de uma oração
à tarde quente?

Lembro-te como um vento brando
viração, aragem, fazendo fremer
de maleita santa as imposturas
de minha lasciva carne
minha alma perdida
e os objetos
de teu quarto branco.

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

A LUA NO BREU


A lua, quando nasce, é um cisco
Semente... serenata
Flutuando ao léu.
De corpo crescente ou minguante
Uma nau brincante no céu
Que navega e reluz
Entre as estrelas
Entalhes de prata
Luz que silencia no alto
Um enigma que a todos conduz.
Caminhemos, tu e eu
Em alento, júbilo de peregrino
Pela clara beleza da noite
Enquanto a lua, agora plena
Vai desafiando o breu.

Claudia Gonçalves & Ricardo Reis

PARA QUE METAFORAS?


A Alberto Caeiro

A poesia
em acorde de sinfonia
em sonhos, metaforas
nada nos fala
à tudo que importa
apenas silencia.

Só deve haver
o devido alarido
quando a verdade
da poesia
se aproximar da que
se vê na vida.

Ai, soma-se, então
um que de lirismo
uma pitada avulsa
de melancolia
e pronto, voilá:

Uma poesia realista
e altiva. Mesmo que sem
nenhum grande alarde
ainda que
para as dores do mundo
não seja a solução definitiva.

VENTO MINUANO

Se eu versejo, sobretudo,
pelo o que na terra
em lume se assenta,
é só mesmo quando
eu eu te vejo, musa e poeta,
é que, então, eu vejo tudo.

E ai, eu tento sonir o arpejo,
a prima ode, um beijo na boca
da noite, que se faz silente, silente,
quando o teu minuano venta.

E este teu vento plano,
poeta e musa, como no Mar Egeu
ao encanto das linguas mortas,
cala ainda mais o já mudo verso meu.

ATO REFLEXO

o dia
chegará
em que
o destino
imóvel
da mão
selar-se-á
na inutilidade
de um abraço.

FESTA NO CÉU


Nossos atos nos escravizam
mais do que nos libertam
pois nos fixam em um momento
um infinito de tempo, um lapso
alem da boa sorte, aquém do arrependimento.

Escravos, tambem o somos
dos desejos, a fora os atos, e estes nos torturam
e matam, como os militares
de sessenta e quatro
torturaram e mataram jovens idealistas
assim, sem nenhuma emoção.

Nossos amores são promessas vãs
de permanecia eterna, pois o mais
perto que chegamos, é de lançar olhares lânguidos
algo tristes, por sobre os muros da humana contenção.

Devolvamos nossas almas à liberdade do eterno plano.
Quiçá seremos, afinal, felizes
observando-as à voar
levando nossos sentimentos encarnados
em passaros exóticos, tuiuius, fenix, urubús
tucanos e jaburus (sim, os belos jaburús)
pois só passaros tão grandes podem arrastar nosso éter
flamas dilatadas de amar e de sofrer
até a alegria da grande Festa no Céu.

CONTRAPONTOS

o amor são os contrapontos
os inversos os signos trocados
ausente/presente que só se resolvem
nos interditos nos interditados
e nas permissividades
no alento e na contenção/explosão
no vôo da grou na queda no tempo
o tempo dilatado de um suspiro
é a eternidade!
O amor como um ente para contar-se
entre a plausibilidade da cópula
como uma condição prosaica
farsesca e a existência insistente
da poesia como língua atonal própria
aos amantes deve saber que amar
não é dimensão naturalista
é a magia a falta de fôlego enfisema pulmonar
provocado pelos suspiros de espera desta espera
inquieta incontida um pico na veia
pra fazer correr moléculas de uma alegre insânia

LINGUISTICA


A poesia é proverbial
e de grande serventia
por explicar a afeição
dotar de asas a rebeldia
aquilatar o que se vê
dar valor ao que se cria.

O amor só se entende
longe da monotonia
e o poeta tem por oficio
recolher a tais emoções
tanto que, dos confins
da terra, vai ao céu
atrás de musas quietas
em busca da parceria
das airadas Marias
sejam elas mulheres belas
sejam as feias, ou as etéreas
e, ainda, aquela tão linda
que, por augusta, passeia
num mafuá de província
em roda, no carrossel.

A mulher, por mais triste
mirrada ou pequena
é musa, e tem o seu vate
que a proclama em poema.

Ele, andarilho, vem da região
do encanto, verter-lhe o sumo
da vida, trazendo o amor por dístico.

É por isto que a poesia, em tudo que fala
amplia, faz de um simples beijo, um verso
algo muito mais do que corpo, do que sexo
do que lânguido, algo
por assim dizer - lingüístico.

SONETO DA SOLIDÃO NOTURNA

Se de um pé após o outro, em sucedâneo
Indago à que lonjuras me levam, noite escura
Passos hesitantes, infante cruzando linhas
Que do Atlântico seguem ao Mediterrâneo.

No roteiro desta servidão em que navego
Em que porto? Qual chegada a que se alcança?
Suster a infinitésima partícula de esperança
De que se aproxima o fim, interminável desterro.

Em desapego, inseguro e assim sozinho
Sem Vivaldi a socorre-me entre as Estações
Sequer viv´alma soando música no caminho.

Na derrota deste meu desiderato, seguiria em frente
Na insone noite, não deixar-me-ia vagar soturno
O amor viesse, desabrido, resgatar-me coração, corpo e mente.

TEMPOS DE CÓLICA


Caminhante neste tempo ocioso
olhar fixado, devoção demente
eterno tempo à se perder no firmamento
irrenovado, mais que sempre, recorrente.

Cruzando sendas, então, estreito os passos
em calçadas de antanho, já traçadas
à simular pistas novas, ilusões de veracidade
forças vitais de um amor, de certo, ocluso.

Inescrutável ardor, inútil/fútil vaidade
condenação virgiliana ao inferno tenebroso
de um desencontro de todo inexplicável.

Longas calçadas com furinhos no cimento
cobertas de inservíveis frutos diminutos.

Levam para onde ?

Para o nada, ali, mais adiante
nesta cidade de horizonte enganador.

Para onde me levam estes meus passos dúbios?
Passos miúdos, de meu filho, para onde?
Para onde o cavalinho de brinquedo
e a esperança imotivada de criança?

Amor e tristeza são presenças pressentidas
na letargia magnífica deste fracasso insuportavel.
Como explicar, mais que entender, perdidos passos?
E este nunca entronizado em nossas vidas?

Mas, como dói, como dói, esta cólica incurável.

AMARGO AGRADO

Não se pode ter de tudo
toda paisagem que se veja
todo agrado, toda partida de seda.

Não se compra carinho
em balcão de armarinho.

Nem todo peixe vem
no retorno da rede.

A noite nem sempre
vai recobrir um dia feliz.

Não se pode ser feliz
alem da pouca parcela
que nos é dado à conhecer
em nossa quadra de vida
devida.

A vida inebria vicia e mata
mas, mata ainda mais
o medo da vida perder
o medo da morte das coisas
é o que nos evita o viver.

São tantos os amargos engodos
tragados com desdouro
com açúcar e spirulina
junto ao fel do entardecer.

AMIZADE VERDADEIRA


Fazer amigos não é fácil
como pensas.

Não é como fazer chover
sonhos e retalhos de prata
numa cama de seda egípcia
que tu dividirias com a Nicolle Kidmam.

Não é mesmo assim tão fácil
quanto conseguir-se um amor profundo
imune às duvidas e ao corroer dos dias ruins.

Fazer amigos, de fato, não é fácil
como se pode pensar.

Portanto, mesmo aquele
teu amigo da onça
trate-o de conservar.

A FABULA DO SOL E DA LUA


O sol mudou o curso do rio,
iluminou o umbral,
vestiu-a de Kilimanjaro,
noite, sidra e marfins,
aos pés da lua depôs.

Sem dar por contas, ela dizia:
“Por mim, qualquer cousa seria”.

E por amar a lua tanto assim,
verteu-lhe para o latim,
uns mil poemas de amor.

Deu-lhe a pedra de toque,
se esponjou na salmoura,
colheu no jardim saduceu,
dentre todas, a mais bela rosa.

E, ainda assim, lhe falou a lua:
“Não cuides por mim.
À mim, compraz-me
qualquer cousa”.

Quando ficava, então,
mortiço, é que a lua aparecia.

Quando sem luz e mofino,
fêmea, ela resplandecia.

E só depois de dançar
qual ninfa no ceo,
em tal rito de alegria,
ao ouvido do sol triste,
a lua suave, dizia:
“Senhor sol, meu, tão querido.
Mal não lhe fará, entender
o que lhe digo.
Não me faltarão riquezas,
amores e nem honrarias,
porquanto minha é a dádiva
de banhar de nívea prata,
sobre o mundo, à qualquer cousa”.

MELHOR SERIA

Eu não te quis, quando viestes.
Não te prometi o Everest.
E nem mesmo, eu devolvi um amor
Que era tão lato de alegria.

Tive, de amor, o medo
E daquilo que eu sentiria
Se a ti, me fosse entregar.

Daquele amor que me tomava
A cada momento em que eu te via.

Hoje, se a tua ausência
Já não mais me aduzisse a aflição
Creio que poderíamos
Ser assim, mais verdadeiros.

Se, um dia que fosse
Tivesse me visitado a virtude
Da amorosa franqueza
O bom seria ter-lhe dito
Que sem você, invadir-me-ia
O desespero, e que
De fato, viria a tristeza
A me tomar por inteiro.

URBI ET ORBI


Pássaros urbanos em revoada
nas ruas do centro, ainda tão cheias do sol
mas, já proximo da noite
num dia de semana normal.

Vou caminhando de mocassins
sobre as pedras largas, na calçada
da Praça Quinze, depois de sair de
uma exposição sobre
o Niemeyer, no Paço Imperial.

Meus olhos que ardem
estão plenos de sólidas curvas
femininas, que pulam (as curvas)
da arquitetura, para o delineio
dos corpos, na perfeita vantagem
de, sob os vestidos, rodearem os seios
ou no mourejado balanço dos quadrís
das mulheres à minha frente.

Mas enfim, o Rio vai fervilhando
desta gente laboriosa nas calçadas
apesar do sol caliente
e eu, aqui, poeta diletante
só pensando em sacanagem.

Minha cidade me absolve
e por certo, me entende sim
e, quiça, o Brasil também
que ali na multidão multicor
já saúda-me, sorrindo
tão displicentemente
que vai renovando-se
o lirismo, que se
envergonhara de mim.

segunda-feira, janeiro 29, 2007

SOB A LUZ DA LUA FRIA


Combinam-se os elementos
na alquimia de um amor sem igual
e que se faz intenso e pleno
sob a luz da lua fria
como a essência de um perfume
liga primordial.
O fogo da luz fria, vai crepitando
derramando-se, como semem
pelas ancas abissais, falésias
precipitação no ar em vôos
ascenssores pelos litorais.
A musica atonal que a todos
enleva, exercícios de sedução.
O filtro do amor que lança
os entes, ao desespero do sexo
em um torpor dolente.
Os frutos deste amor
porque só aromas, ninguém
os come, e se não são do mar
ou da terra, ficam caídos
pelos cantos na areia seca
do deserto, ao alcance
da sede e da fome.
E são aquosos, já mordidos
liquefeitos como os rios
que levam as almas
à promissão, à explosão
de paixão e de cardumes.
Os peixes jogam o claro/escuro.
Sereias margeiam mentes, e são
as fantasias de um romance épico
que é mais que a vida, que é mais
que o mar eterna calma em propulsão.

quarta-feira, janeiro 24, 2007

ILUSIONISMO

Tantos caminhos são artifícios
para uma impossível chegada
que vale palmilhar a lembrança
rota de fuga pelo cimo dos edifícios
um caminhar pretérito, viver nos ofícios
de um pretenso saber de mistérios.

Para a arte do escapismo
não caberão latitudes
que não sejam as marcadas no peito
na pele profanada e rude, tatuagens
cicatrizes da boçalidade e as beatitudes
beijos e, talvez, o disfarce, talvez, o absinto.

Não sei mais dizer o que sinto.
Prestigitador. Sumir no vapor da tabacaria
num sortilégio brilhante, nas baforadas, nos rolos
de fumaça, na avenida febril, inebriante
plena selva de faces tortas. Sou infeliz e minto.

Na buzina, o trinado do pássaro metálico, mutante.
Eu devia a ti, um mergulho na vida, na relva
na memória das trevas, no passado de chumbo
o presente irrelevante, irrevelado.

Não é só pelas plumas leves
escuras ou claras, que se conhece um pássaro.
Sabe-o no voar, e também, pelo trinado.
E a vida, se vai raptando a sorte
na esperança de distrair a morte.

NINFA EM SONO NA RELVA

A Anelise Tupinambá

Dedico-me a observá-la
Em seu plácido enlevo de sono
Cuidado em madrigal levedura.

Seu corpo entregue, lânguido
Em negra gaze, envolvida
E, como na relva, disposta
Uma éterea dama, de serena ventura.
De tez tão clara, e, ainda mais
Assim, adormecida.

Vê-la entregue à navegação
Dos sonhos, é vislumbrar
Num só instante mágico
No agora, o que, por meu desejo
Houvera sido, ausente as neves
Da nossa mutua incongruência.

Destarte, mesmo o acaso
De alguns suaves e ternos beijos
Longe das luzes de qualquer ciência
Vê-la assim menina bela
Como boneca de louça
Entregue ao seu próprio levitar
Nem mínima ruga na fronte alva
Que lhe turve o sono fundo
Devolve-me a crença e a plenitude d´alma
Sem que Deus nenhum me ouça
E, faz-me ledo entender o porquê
Simulo tanto, o porquê de tanto medo
E porque tanto, que a mim, eu minto
E de pronto, porque tanto te amo
Ao observá-la, velando
O seu doce adormecer
E, em que pese o que mais sinto
Ninfa tormentosa do oceano
Creio que passo a compreender
O desencanto à que tornamos.

UNIVERSO OCULTO

Teu beijo escasso
mostava os dentes
enquanto teu verso curto
deixava entrever estrelinhas
nas entrelinhas.

domingo, janeiro 14, 2007

AO SUL DA POESIA


A Claudia Gonçalves

Sonhei, com um virtual encontro, onde vía-te sobre o Guaíba,
flanando, melenas soltas em livre augúrio,
e a lira, pronta à qualquer encanto.

Eu te seguia, poeta-musa, desde o Rio de Janeiro.
Deixei-me também ir ao vento, que alisa a serra e as vargens,
e ao litoral, que não há como cá.
Estas já foram às terras da grande nação Tupinambá,
outrora, antes de Rousseau e de seu mito do bon-sauvage.

No delírio, ao vento leve, Heracles, eu ia ao teu encalço,
como no resgate de Alceste,
e do Hades, planura primordial eu fazia,
com muitas luzes e flores,
contextura, que a tempo breve, acenderia
o sopro eterno da poesia.

No sonho, emergia pelas colunas de mormaço,
que envolvem à meus pares, nestes tempos quentes.
Quando tais ousadias, aos estratos alçaram-me,
por sobre a imensidão dos mares, por sobre todas as gentes,
olhei para o mapa da terra, de onde nunca se viu,
e fui bordejando à bubuia na autopista celeste,
cortejando em adejo o celeste azul, pela costa do Brasil.

É, poeta-musa, eu te seguia. Rudimentos mágicos da natureza,
eu a via combinar num instante em teus belos poemas.
Irmanada, pois, aos pássaros, no caminho sobre as ilhas,
num amavel voar constante, buscava o Alegre Porto,
indo às terras Farroupilhas.

Entoavas místicas cantigas, e tantas,
que eu diria que, doces quebrantos.

Juntos, iamos em galope jovial e presto.
Em parelha no céu,os eólicos ginetes:
O meu, sudoeste médio,junto ao seu,
minuano dos pampas.

Os ares, como a poesia, varejam a alma dos povos,
e os sonhos, tudo nos permitem,
estas quimeras gigantes.

E foi assim. Os ventos, campeando gautério a liberdade,
pela gauchesca praia, ou pelas aldeias Carijós,
que havia no entorno da Lagoa dos Patos.
Se pudessem o sonho e o poema vencer aos fatos,
ali, aqueles elementos, já teriam anunciado,
à quem escutar se dispusesse, a emergência de um tempo novo.